Sim senhor, deu abelha na cabeça! Mas, até que tudo ficasse esclarecido... Foi assim. Nossas amiguinhas se instalaram em poste de rua movimentada, com camelôs pelas calçadas e, como sempre, fazendo o maior fuzuê. Vez por outra algum desavisado pegava uma espetadinha na orelha. Havia sempre um engraçadinho que, "sem querer", batia no poste com um ferro de barraca. Olhava absorto querendo entender por que de um dia para o outro as abelhas resolveram usar como saída a cabeça, o alto do poste, e não mais o orifício mais abaixo como sempre faziam.
Absorto com o vaivém das abelhas, ouvi alguém perguntar: "Que bicho deu?" (aqui no Rio, "que bicho deu" pode ser: o que aconteceu?, o que está acontecendo?, o que houve?, qual o problema?...) Pois bem, respondi sem pestanejar: "Abelha na cabeça". A gargalhada da turma chamou-me à real. Era uma senhora de meia-idade, que havia feito a pergunta e, de bate-pronto, com cara de zangada, interpelou-me: "Está fazendo hora com a minha cara ou depois de velho virou engraçadinho?". Aí não deu pra ninguém... até eu mesmo comecei a rir.
Como para a turma da calçada tudo é motivo de graça, imaginem minha situação. Exatamente naquele poste colavam o resultado do jogo do bicho. O incidente rendeu uma aula pública de apicultura. Mostrei à senhora as abelhas entrando e saindo carregadas de pólen, falei que ali dentro tinha mel, cera, geléia real e o veneno das abelhas ajudava no tratamento de artrose, decerto havia própolis e por aí.
Estávamos nesse papo agradável quando uma vendedora de bijuterias chegou esbaforida, dizendo a meia-voz: "Deu zebra, pessoal!" (era a senha para avisar da chegada da guarda municipal).
Em segundos o grupo se desfez. A maioria jovens na faixa dos 20 anos. Universitários com matrícula trancada, outros com pouco estudo, morando em favelas, acuados pelo desemprego, pelo tráfico, pela guarda, mas de qualquer modo tentando sobreviver com um mínimo de dignidade, até mesmo escrevendo o jogo do bicho, em que de fato "vale o que está escrito".
Ia despedindo-me da senhora quando um guarda, aproximando-se, perguntou-nos: "Algum problema?" Ela, sem perder tempo, apontou para as abelhas e respondeu de modo jocoso: "Sabe, meu filho, é que deu abelha na cabeça... do poste!". Prendendo o riso, fomos embora conversando um pouco mais.